domingo, 16 de dezembro de 2007

Apenas uma carta


Oi...

Eu nem sei porque escrevi "oi" no início, mas eu disse no título que seria uma carta, e cartas geralmente começam com algum tipo de cumprimento, então... Para ser objetiva, esta não é uma carta sobre o passado, mas uma carta sobre desejos para o futuro. Não, eu nem sei se é na verdade isso, mas enfim, eu só queria te contar que meu quarto hoje tem cheiro de rosas.

É uma coisa simples, mas ficou aqui atravessada. Eu nem sei se você pode entender e no fundo é isso que mais me cala. Eu sempre acho que você não entenderia. Não é culpa sua, também não é culpa minha, eu sei. Nunca é culpa de ninguém.

A gente sabe como ninguém o que são conexões perdidas, o que são fusos-horários diferentes.

Eu só queria tempo! Não aquele tempo para colocar as novidades em dia. Não aquele tempo para falar do cotidiano. Esse nunca me faz falta. Eu sempre tenho com quem falar sobre coisas banais e creio que não é diferente com você. O tempo que eu queria é pra falar das coisas que eu guardo aqui dentro bem trancadas. Eu queria o tempo suficiente para olhar em seus olhos e sentir que você é a pessoa certa e que com você eu posso dividir. Não que sejam coisas assim tão significativas, tão importantes ou tão surpreendentes, mas em todo o caso, são coisas minhas.

Eu acho que estou divagando. Estou inclusive exagerando. Sim, eu tenho esse problema com exageros... Mas não é por mal. É por amor, juro. Amor às palavras. Amor às palavras de amor.

Eu apenas queria que você soubesse que eu não desisti. Eu não abandonei o sonho antigo, apenas aceitei que não seria possível realizá-lo. E céus! Isso me doeu. Isso me dói. Isso eu carrego comigo sempre e sempre. E é por isso que eu mergulhei naquela crise tão difícil de sair. Não sei se você já sabia. Eu simplesmente acho que não sabia.

Um dia eu me peguei vivendo uma vida que não tinha nada a ver com o que eu sonhei, trilhando um caminho que me levaria a um lugar ao qual eu não queria ir. E o pior é que nem foi erro de cálculo, foi de alguma forma uma escolha. Uma escolha que de tão pensada, era impulsiva. Logo eu que sempre fui tão orgulhosa da minha própria consciência. Pois é... A minha consciência me traiu.

Sinto muito orgulho por você. Você tem sido forte justamente naquilo em que eu fui fraca.

Mas esta não é uma carta sobre o passado. É uma carta sobre o futuro e sobre meus desejos para o futuro. Aconteceu que em meio a essa crise, meu quarto passou a ter cheiro de rosas. E veja bem, aquelas rosas que habitualmente se vendem, não têm perfume, mas esta exalou um perfume tão intenso que se espalhou por todo o meu quarto e impregnou minha pele. É uma rosa branca incomum, inebria.

É, estou feliz. Estou trilhando um novo rumo e você me verá cada vez mais nele. O sonho pode parecer diferente, mas na verdade não é. Você pode até pensar que sou apenas uma pessoa capaz de fazer muitas coisas bem feitas e que um dia colocou uma idéia na cabeça, foi atrás, viu que não era isso e desistiu. Mas não é isso, não mesmo. Eu tenho um tipo de essencia artística que mesmo tentando não consegui negar. É uma necessidade. É uma agulha que cutuca, cutuca e não me deixa descansar. Arde a arte. Acho que isso você entende.

Estou começando um novo caminho: vem comigo. Se não der, encontre-me lá no final, eu vou ser igualmente feliz.
Enfim... Eu só queria que você soubesse...
Não esqueça: meu quarto hoje tem cheiro de rosas. E é um cheiro forte, inebria.

sábado, 24 de novembro de 2007

Porque eu tenho um plano

_ Pra onde você vai?
_ Eu... Eu vou... Eu... Eh...
_ Você?
_ Olha, eu, eu... Eu tenho um plano. Isso é tudo que você precisa saber.
_ E é seguro esse seu plano?
_ Seguro, eu não sei... Mas, é um excelente plano, garanto!
_ Sabe, eu gosto de você, não quero que você se machuque ou se decepcione...
_Eu sei, eu sei disso!
_ Ás vezes, é importante ter um "plano B".
_ Não, não há um "plano B"! Nem pode haver! Isso é o primordial!
_ Você é louca, menina?
_ Você não entende... Se houver um plano B, eu vou me contentar em não realizar o plano A e vou desistir na primeira dificuldade. Então... Nada de plano B! Eu tenho um plano, um único plano e dará certo simplesmente porque eu não saberei o que fazer se não der.

(...)

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

O problema da literatura

Certa vez, não faz tanto tempo assim, quando eu ainda considerava válido me preocupar com a política, fui advertida por um colega de sala para que eu não me envolvesse demasiado com aquilo tudo. "O problema da política é que ela é política", dizia-me ele. O colega não me era tão próximo e mal tínhamos trocado umas poucas frases e a isto talvez se deva o tom enigmático com que suas palavras me atingiram. Em outras palavras, não entendi bulhufas!

Passou o tempo e um maior conhecimento da própria política e da forma como suas estruturas operam, levaram-me à um afastamento do militantismo e a um longo e profundo silenciamento. Finalmente entendi e é fato: "o problema da política é que ela é política".

Bem, mas este não é e nem poderia ser um texto sobre política,trata-se pois, de um texto sobre a palavra escrita. O tema não me é nem um pouco original e se eu tivesse escolhido a política este texto certamente seria mais inédito, mas o leitor que o considerar enfadonho pode pulá-lo e isso não lhe fará falta alguma.

O problema da literatura é que é literatura. Palavras são palavras e sendo assim valem muito ou pouco, dependendo das expectativas de cada um. Nem me cai bem fazer um apelo à prática, uma vez que meus estudos e a vida que tenho levado levaram-me a tal inflexão teórica que aquilo que chamo "prática" no dia-a-dia é um exercício essencialmente teórico, mas ainda assim, apenas hoje, quero me voltar contra a textualidade excessiva.

Multiplicam-se as palavras, mas quem vai lê-las? Quem vai tirar proveito delas?

E não fosse o problema da própria escrita e das próprias palavras, a literatura tem um outro: o da invenção. Eu mesma, para tornar um texto bonito torço as palavras e as encaixo de forma que seus sons agradem meus ouvidos - e minha mente, um sentido ainda mais apurado e exigente. Ao torcer as palavras, brinco também com seus significados e misturo a realidade à fantasia, recusando-me a dizer diretamente qualquer coisa que seja. Ora, hoje repudio não só a literatura e sua verborragia mal explicada, mas também sua preocupação estética!Não, hoje eu não quero pentear os cabelos, quero é ficar de pijama o dia inteiro.

E onde chagamos com tudo isso? Perdemo-nos num labirinto de palavras com que intento? E por fim: o que afinal de contas isso quer dizer, na prática?

domingo, 11 de novembro de 2007

Sem título 3

Você lembra quando me deu aquela caixinha com um laço de fita vermelha?
Puxa, eu achei tão bonita aquela caixinha.
Nem quis abri-la para não correr o risco de estragar.
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Você disse que o que tinha dentro da caixinha era meu, só meu.
E eu quase desacreditei...
Mas que era sua intenção, isso era.
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Hoje abri a caixinha.
Acabou a pena da fita.
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Lá dentro eu vi um mundo em palavras.
Lindas palavras...
Escolhidas com capricho, com devoção.
Mais do que isso: escolhidas com paixão e com dor.
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Mas a verdade...
A dura verdade é que não era verdade.
As palavras nunca foram minhas, e nunca poderiam ser.
As palavras eram no máximo tuas.
E eu fui no máximo o teu pretexto.

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Sem título 2

O menino olha a menina de longe e ensaia uma aproximação. Pára, olha, pensa... Retira do bolso um pedaço de papel amaçado e um toco de lápis. Encostado no tronco de uma arvore, o menino rabisca uma declaração de amor com sua caligarafia ruim. Olha novamente para a menina, as mãos trêmulas. Decidido, ainda que com medo, caminha em direção a ela. No caminho, arranca uma florzinha amarela do mato.
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- Ó! É pra você.
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O menino assim se faz presente.
O menino assim mostra que ama.
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A menina olha, gagueja, tenta. Não consegue. A palavra não sai. Agradece apenas com um leve sorriso.
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O menino se decepciona e vai embora, triste.
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A menina sussurra, já sozinha: "eu também".

(Texto rabicado no mês de outubro, na última página de um livro.)

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Meu corpo

Cada inspiração é um anseio,
Cada expiração, um vazio...
.
Cada centímetro de minha pele...
Mesmo as pontas,

.........as pontas dos dedos;
Cada pingo de meus fluídos...
Mesmo as gotas,
. .......as gotas de saliva;
.
Tudo, tudo em meu corpo te espera.
. ......................... . e te precisa.
.
Meu seio pulsa em tua ausência.
. ..........................Toca-me.
Minha nuca não cede sem teus beijos.
. .................................Suga-me.
Minhas pálpebras não cerram sem teu amasso.
. ...................................... Penetra-me.
.
Invada-me,
Preencha-me,
Completa-me.

.
Meu corpo é um corpo que saudades sente.

quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Giz

A menina desenha uma reta no chão com um toco de giz. Dá três passos para trás, olha, pensa. Lembra das aulas de matemática e coloca uma seta em cada extremidade da linha. Sem isso, ela teria apenas uma semi-reta e era uma reta que ela queria, com os dois lados indicando o infinito.
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E afinal, que tipo de coisa precisa se mostrar infinita desta forma? "Ora, o tempo", diz a menina.
.
A menina caminha metade da reta como quem se equilibra no meio fio, para e se senta ali mesmo. Ali, naquele ponto exato, um ponto em meio ao infinito de pontos que compõem uma reta a menina esmaga o giz, com certa fúria. Ali estava o seu presente. Só ali.
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Nada mais inquietante que poder olhar para um passado que se estima e para um futuro que se sonha, sem poder estar em nenhum outro lugar que não o presente. E sendo assim, a menina não pode ver o tempo isenta de preocupações.
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Perdida em questionamentos, a menina suspira bem alto. Fecha os olhos e se permite sentir a brisa. Levada pelo suave toque do tempo ela deita, as pernas soltas, semi-abertas. Com os dedos ainda sujos de giz, ela contorna os próprios lábios, tingindo-os de branco. E assim a menina espera. Espera que o vento lhe faça mulher e a leve para longe, muito longe dali.

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Texto sem inspiração numa noite inspirada (ou não)


Sabe... Eu vou contar uma coisa só pra você...
Eu tenho um vício.
Um vício antigo, desses difíceis de largar.
Nada assim muito pesado...
Não vou morrer de câncer ou de overdose por causa dele.
Mas tem lá o seu teor corrosivo.
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Sou muito apegada ao passado.
Todo o tipo de passado.
Mesmo o meu...
Principalmente o meu.
.
Eu tenho até uma mania.
Mania de cutucar feridas.
Nem sempre dói.
Dessa vez nem doeu, juro.
..
Quando criança,
eu lembro que costumava raspar a palma da mão com um estilete.
Até sangrar.
Fazia meus desenhos.
Esculpia minhas iniciais.
Certa vez... eu inventei de tentar fazer uma tatuagem.
Cutuquei até ver o sangue e tratei logo de pingar tinta de caneta rosa lá dentro.
Quando a pele fechou, ficou lá o sinal.
Depois desapareceu.
Não deu certo.
Desisti.
..
Modifiquei a mania.
Parei de me cortar.
Só me torturo com a memória de vez em quando.
E não há tristeza nisso.
A tristeza não é triste quando a temos sob controle.
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Uma hora ou outra, todos vamos sangrar.
Então, fazer-se sangrar pode ser só uma medida preventiva.
Uma vacina.
E das boas.
.
Sinto-me mais forte depois daquela cutucada com o estilete.
Até soube que tem uma doença assim.
Um disturbio psicológico.
Ah... Como eu odeio jalecos brancos e luvas de látex!
Fábricas de patologias!
.
Bem, então..
Você já sabe.
Se necessário, eu sei me ferir sozinha.
Eu só preciso de alguém pra me ajudar a respirar.
Seja meu ar...

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

sem título


Tudo sufoca.
Tudo, tudo, tudo.
E no fim, só o que realmente permanece é o olhar triste, desolcado no tempo.
.
***
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"Existe apenas uma solidão, e ela é grande, nada fácil de suportar. Acabam chegando as horas em que quase todos gostariam de trocá-la por uma união qualquer, por mais banal e sem valor que seja, trocá-la pela aparência de uma mínima concordância com o próximo, mesmo que com a pessoa mais insignificante... No entanto, talvez sejam justamete essas as horas em que a solidão cresce, pois o seu crescimento é doloroso como o crescimento de um menino e triste como o início da primavera. Mas isso não deve confundi-lo. O que é necessário é apenas o seguinte: solidão, uma grande solidão interior. Entrar em si mesmo e não encontrar ninguém durante horas, é preciso conseguir isso. Ser solitário como se era quando criança, quando os adultos passavam de lá para cá, envolvidos com coisas que pareciam importantes e grandiosas, porque esses adultos davam a impressão de estarem tão ocupados e porque a criança não entendia nada de seus afazeres."
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(RILKE, Cartas a um jovem poeta)

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

O amor que nunca se declara

A menina ama, ama mais do que as palavras.
Ama o amor profundo e puro.
Ama tanto que dorme e acorda com um só pensamento.
Ama e olha para o teto, e suspira.
Ama e olha para os papéis coloridos,
.......................para as caixas de sapatos,
.......................para o pôr do sol,
.......................para o espelho,
.......................para os próprios pés,
.......................para os óculos de sol,
.................................................e suspira, e sorri.
Ama tanto que tem medo, muito medo.
Ama tanto que chora, que sofre.
Ama tanto que tudo guarda.
........................Guarda até as próprias lágrimas.
........................Coleciona vidrinhos, vidrinhos de lágrimas e diz que vai fazer uma estante com eles.
A menina é íntima do silêncio.
A menina só sabe amar sem palavras.
A menina nunca, nunca se declara.
E também por isso, o amor que a menina sempre espera nunca, nunca fica.

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Sexo seguro


Use sempre camisinha.
Evite se relacionar com estranhos.
Investigue o histórico sexual de seus parceiros.
Peça periodicamente exames para a comprovação da ausência de doenças.
Use camisinha mesmo em relações estáveis.
Use camisinha mesmo durante o casamento.
Não confie em ninguém.
Antes de iniciar uma relação sexual, ferva seu parceiro durante 30 minutos, para certificar-se de que todas as bactérias estarão mortas.
Após a fervura, desinfecte cada região do seu corpo e do corpo do parceiro com álcool e água destilada.
Envolva-se em plástico filme completamente do pescoço aos pés e peça para que seu parceiro faça o mesmo.
Evite a troca de fluidos.
Evite a troca de saliva.
Evite a troca.
Prefira a masturbação ou o sexo virtual.
Reproduza-se em laboratórios especializados.
Invista em outras formas de recreação a dois.
Coma mais chocolate.
Se possível, mantenha-se casto.
Resista!
Evite, sobretudo, o sexo.
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Mandy... Isso sim é piada.
:)

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Trânsito


_ Desce todo mundo! O ônibus estragou!
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Hoje, depois de muitos dias sem andar de ônibus, e também depois de muitos dias de promessas de que diminuiria minhas saídas de carro, eis que resolvo sair de casa mais cedo e dar um voto de confiança para o transporte público. Além de ser naturalmente mais caro, usar o carro para ir todos os dias para a faculdade estava me deixando com a consciência um pouco pesada. Sabe como é: queima de combustível, liberação de gás carbônico na atmosfera, efeito estufa, derretimento das geleiras, e assim por diante. E no fim das contas, eu sei bem que essa é uma falsa necessidade.
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Pois bem... Lá fui eu feliz e contente saindo de casa meia hora antes do habitual para chegar no horário. Logo que saí de casa coloquei o mp3 para tocar aquela música de sempre, de quase todos os dias e que traduz bem essa minha mania de ouvir a mesma música até enjoar: "ouço a mesma coisa, o tempo inteiro em janeiro em dezembro, uhu". Durou pouco. Duas frases e se foi a pilha. Tudo bem, eu compraria pilhas novas assim que chegasse ao terminal.
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Quando o alimentador chega no terminal, já está lá o ligeirinho a minha espera (tudo bem, não estava só a minha espera e sairia de lá assim que eu me movesse em sua direção). E aqui, faz-se necessária uma pausa, para explicações de caráter meramente cultural:
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O transporte público em Curitiba:
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A cidade de Curitiba é conhecida em todo país pela qualidade de seu transporte público (na verdade, não é o transporte público em si que chama a atenção, mas as estações tubo que são bem bonitinhas). Tanto que, quando mudei-me para a cidade, recebi um bilhetinho de um amigo, com aquelas coisas todas de "tudo de bom pra você", "boa sorte" e entre elas, estava lá no cantinho da página um "e ande bastante de ônibus por lá que é bem legal".
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Divagações e piadinhas à parte, cada tipo de ônibus dos que circulam em Curtiba tem uma cor e um nome diferente. Os alimentadores são de cor laranja e fazem o transporte das vias locais aos terminais e os ligeirinhos, por sua vez, são prateador e param apenas em terminais e em poucas estações tubo. Têm esse nome justamente por fazerem o trajeto de forma mais rápida, o que é possível pelas paradas mais espaçadas ao longo do caminho e também pelo comportamento de seus motoristas no trânsito, que nunca param em sinais amarelos e se impõem pelo tamanho na disputa por espaço nas ruas. Li em algum lugar que esses ônibus são os maiores causadores de acidentes no trânsito na cidade (e sim, eu os detesto). Há ainda outros tipos de ônibus, mas para este texto, a explicação sobre esses dois basta.
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Voltando ao terminal:
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Realizar as duas tarefas (comprar as pilhas e pegar o ônibus) não seria possível. O momento pedia uma decisão, e rápido. Pilhas, ônibus, ônibus, pilhas. Pronto, ônibus. E lá fui eu correndo para pegar o ligeirinho. Entrei. Ônibus lotado. Olhei em volta, vi uma moça de cabelos castanhos longos, com as pontas encarocoladas e lindos olhos verdes. Pensei comigo: pelo menos, de paisagem estou bem.
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Começa o percurso e eu me sentia verdadeiramente feliz por estar ajudando o planeta. Não tinha culpa nem pelas pilhas, afinal, eu não as comprei. E tinha a intensão sincera de parar de usar pilhas descartáveis, como essas de terminal. Assim que possível, eu compraria um carregador de pilhas e começaria uma nova fase na minha vida. Até podia sentir o ar mais puro, que maravilha! O próximo passo seria o fim da vida sedentária. E depois... Meu pensamento foi interrompido por um apito agudo, chato e constante. O ônibus parou. E o barulho, idem.
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Passam poucos minutos e o motorista avisa que todos devem desembarcar e esperar o próximo ônibus.
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A Lei de Murphy:
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Sim, sempre que há alguma chance de algo dar errado, dará errado. "Chama-se murphy!"
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Pois é... Maldito Murphy!
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A Espera:
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É importante que não esqueçamos que o ônibus estava cheio e era um horário de ônibus cheios, então todos os demais também estariam igualmente cheios. Esperar o próximo ônibus significa, então, esperar os próximos ônibus, uma vez que dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço (ou mais ou menos isso, não lembro mais de física).
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Entrei no terceiro ônibus. O intervalo entre um e outro é algo entre 5 e 10 minutos. Total do atraso: 30 minutos. Ou seja, tempo gasto para ir à faculdade de carro: 15-20 minutos. Tempo gasto com o transporte público: 40-45 minutos. Tempo total da viagem: mais de uma hora!
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Salvar o planeta bem que poderia ser mais fácil! Da próxima vez, eu planto uma árvore.

sábado, 29 de setembro de 2007

Casa comigo





"Casa comigo que te faço a pessoa mais feliz do mundo. A mais linda. A mais amada. Respeitada. Cuidada... A mais bem comida. E a pessoa mais namorada do mundo. E a mais casada. A mais festas... Viagens... Jantares... Casa comigo, que te faço a pessoa mais realizada profissionalmente. E a mais grávida. E a mais mãe. E a pessoa mais as primeiras discussões. A pessoa mais novas brigas e as discussões de sempre. Casa comigo, que te faço a pessoa mais separada do mundo. A pessoa mais solitária com um filho pra criar de todas. A pessoa mais foi ao fundo do poço e dá a volta por cima. A mais conheceu uma nova pessoa. A mais se apaixonou novamente... Casa comigo que te faço a pessoa mais casa comigo que te faço a pessoa mais feliz do mundo. "
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Michel Melamed

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Um outro espaço

Hoje pela manhã, tentei fazer uma postagem no Estive Pensando declaradamente não literária. Ocorre que houve um erro na publicação da postagem e eu perdi o texto. Eu fiquei chateada com o fato, mas bem poderia ficar por isso mesmo... Poderia, mas não ficou.

Fé é aquela coisa que nos faz acreditar que coincidências não são coincidências e num ato de verdadeira fé, eu interpretei a recusa do Estive Pensando ao meu texto como um sinal. Não seria por certo um sinal dos mais sérios, mas se podemos atribuir sentido a coisas que não necessariamente tenham sentido (minha melhor definição para o trabalho de um historiador) aqui estou.

O Estive Pensando sempre foi pretensamente literário. E quando o criei, eu tinha aquela convicção de que literatura é algo que não serve apenas a quem escreve e por isso mesmo não poderia só sensação. Para que a arte fosse arte, precisava ter também técnica ou seria apenas mera expressão. Essa foi uma fase de muitas certezas. E eu realmente estava convicta.

Passou o tempo e eu mudei. Posso ainda escrever histórias sobre outros, que não eu, descrever sensações que não as minhas e mais do que isso, tenho uma certa habilidade para falsear determinados sentimentos indesejáveis. Mas.. e o que se ganha com isso?

Deixei de ter tantas certezas. Passei inclusive a ver com desconfiança quem é muito convicto de qualquer coisa. Não deixa de ser ingênuo pensar que nós realmente podemos ter certeza de algo. Julgo religião e ciência da mesma forma. Não passam de crenças. Tenho nutrido, cada vez mais, uma admiração pela dúvida, pois só ela nos impulsiona à busca.

Se anos atrás, eu criei um blog querendo divulgar textos distantes do meu íntimo, hoje tenho um desejo contrário. E de certa forma, isso representa um retorno e também um crescimento. Retorno porque outrora eu escrevi diários. E crescimento porque com o tempo, a gente percebe que a vida (e as pessoas) nos tira tanto, que precisamos criar instrumentos para mergulhar nas nossas aspirações e pensamentos mais profundos, para que de algum modo possamos nos reconhecer.

E assim crio esse espaço, com a intenção de ser não-literário (na minha definição antiga). Não que isso signifique a ausência de ficção, pois às vezes, aqueles tais pensamentos profundos são repletos de fantasias (e da fantasia para a invenção pura e simples é um passo curto).

Já me parece um crime dizer que uma poesia é apenas uma poesia e que palavras são apenas palavras. Nunca são. Quem escreve, sabe. Alguém mais famoso do que eu disse, em palavras mais bonitas que as minhas, que tirar da poesia a sua capacidade de ser outras coisas além dela mesma, é arrancar-lhe o que ela pode ter de mais rico.

Estou então assumindo que o que escrevo sofre uma influência lógica e esperada de coisas que vivo (ou não vivo), leio, ouço. Até aí nenhuma novidade para qualquer leitor minimamente atento. Eu disse: a influência é esperada e lógica.

Talvez a partir de agora, minhas palavras se tornem mais fluídas e minha poesia mais poética, minha prosa mais pungente. As coisas são de fato mais densas e valiosas quando têm significado. Só não peçam para explicar em que "i" se encaixa cada "pingo". Nem tentem fazer seus próprios encaixes. É melhor deixar esse tipo de atitude para um crítico literário obcecado. Sim, todo crítico (e todo historiador, convenhamos) é em certa medida um obcecado. Ele tem consciência de que sua produção jamais passará de um mal entendido mais ou menos afortunado e ainda assim, continua sua busca. Por mais que haja clareza no que é dito, sempre há silêncios. Silêncios que são silêncios para quem interpreta, nunca para quem escreve.

E é claro...Em alguns dias eu só vou querer conversar, em outros, vou querer discutir um tema sem importância concreta. Com sorte, escreverei poesias. E se houver tempo e inspiração, contarei histórias. Até já tenho uma em mente: a de um amor que nunca fica, e de outro que nunca se declara.